O azeite da coroação do Rei Charles

Tela da Unção

Sempre foi trabalhoso você provar que é melhor que os outros e que, portanto, pode ser rei e mandar em todo mundo. É necessário algum poder militar, uma boa quantidade de ouro, algumas cabeças de inimigos decepadas e, principalmente, uma justificativa para origem divina do seu poder. Desde a Antiguidade até 06 de maio de 2023, quando acontece a coroação do Rei Charles III, na Inglaterra, uma das formas de mostrar a conexão com forças divinas é a unção com azeite. Podia ser pasta de figo, água do Mar Morto, vinho. Afinal, símbolos são sempre arbitrários. Mas por que especificamente azeite?

File:Coronation Henry4 England 01.jpg

Coroação de Henrique IV, circa 1.470 (Jean Froissart)

A origem do ritual

Na abertura da edição 22/23 do Extrafresco: o Guia de Azeites do Brasil, eu comento sobre algumas árvores ligadas à história da humanidade. A casca do salgueiro foi usado por séculos como remédio. Os pinheiros, por causa da sua resina, foram usados como fonte de luz. A figueira é uma das frutas consumidas há mais tempo. Mas apenas uma árvore proporcionou, ao mesmo tempo, remédio, luz e alimento: a oliveira.

Com todos esses atributos e ainda mais a natureza de ser uma árvore centenária, é fácil entender o valor dado à oliveira e à sua transformação em símbolo de prosperidade e paz – coisas que nos conectam com o divino. Um dos exemplos mais antigos registrados da unção de um rei com azeite de oliva vem da Bíblia, onde o profeta Samuel unge Saul como o primeiro rei de Israel. Este ato foi visto como uma confirmação divina do status de Saul como rei e estabeleceu um precedente para futuros reis de Israel serem ungidos com óleo. No Novo Testamento, Jesus também é dito ter sido ungido com óleo por uma mulher em uma cerimônia que foi vista como um sinal de seu status divino. “Messias”, aliás, é uma palavra hebraica que significa “ungido”.

A unção dos reis ingleses

O uso do azeite na unção de reis continuou ao longo da Idade Média na Europa, sempre visto como uma forma de conferir o direito divino de governar. Na Inglaterra, a unção do monarca com óleo remonta à coroação do Rei Edgar em 973 d.C. Mais tarde, no século XIV, um monge entregou ao futuro Rei Eduardo II um frasco de azeite que teria sido recebido por São Tomás Becket diretamente das mãos da Virgem Maria. O rei ficou na dúvida entre ser ungido com o óleo tradicional dos antepassados ou esse, que continha a profecia de que o rei o que usasse reconquistaria a Terra Santa. Acabou optando pela tradição (ah, esses ingleses) e depois passou o resto da vida arrependido. Chegou a tentar ser ungido novamente com o tal azeite da Virgem. O Papa mandou um recado para ele dizendo que se ele quisesse ter prosperidade, deveria é comportar-se de acordo com as leis de Deus e não ficar preocupado com a origem do azeite.

A origem do azeite usado na coroação do Rei Carlos III

O azeite que será usado na coroação acrescenta um simbolismo a mais a história. Ele foi extraído de dois olivais em Jerusalém, localizados no Monastério da Ascensão e no Monastério de Maria Magdalena. É nesse último que está enterrada a princesa grega Alice, avó paterna do Charles. O azeite foi extraído em Belém, cidade de nascimento de Jesus (mais um símbolo) e consagrado em Jerusalém (é possível ver parte da cerimônia de consagração do azeite nessa matéria no Youtube).

Além do azeite, a cena da coroação vai ser composta por um bordado executado por artesão da Escola Real de Bordados (da qual Camila, a rainha consorte, acaba de virar patrona). O bordado de aproximadamente 2 x 2 metros contém a imagem de uma oliveira com 56 folhas representando cada um dos estados membros do Commonwealth.

The Anointing ScreenFonte: https://www.royal.uk/news-and-activity/2023-04-29/the-anointing-screen

Competições de azeite: datas de envio de amostras

Dez de maio de 2019 foi a data da cerimônia de premiação do New York International Olive Oil Competition. Eu e mais catorze jurados de todo o mundo passáramos a semana provando quase mil amostras de azeite. Como as amostras são codificadas, é só mesmo no dia da premiação é que ficamos sabendo quem são os vencedores. Entre outros azeites brasileiros, o Prosperato levou uma medalha e o Rafael Marchetti estava por lá para receber o prêmio pessoalmente. Nós decidimos sair para comemorar, mas não deu muito certo. Onde fomos parar para comemorar a medalha eu conto no final da história.

Cerimônia de premiação do NYIOCC, maio de 2019

Por que participar de competições

Ganhar uma medalha em competição internacional é sempre um atestado de qualidade. Mas isso também representa um investimento alto para o produtor, já que a taxa de inscrição pode custar até 250 euros, sem contas as despesas de envio. Por isso, há também muito ótimos azeites que preferem não entrar em competições.

O consumidor brasileiro dá valor às medalhas. Quando muitos ainda torciam o nariz e não acreditavam que produzíamos bons azeites, a participação em competições foi uma maneira de a Prosperato mostrar para o consumidor a qualidade dos brasileiros.

Competição com datas ainda abertas (atualizado em 09/04/23)

 

Anatolian IOOC 15-Apr https://www.anatolianiooc.com/
European IOOC (Genebra) 15-Apr https://eiooc.com/
Berlin GOOA 18-Apr https://berlingooa.com/
Oil China 18-Apr http://www.eoliveoil.com/olive-oil/oliveoilcompetition.html
SIAL 26-Apr https://sialcanada.com/en/olive-dor-competition/
Masters of Olive Oil 30-Apr https://mastersofoliveoil.org/
Leone D’Oro 01-May https://www.leonedorointernational.com/
EVO IOOC 05-May https://evo-iooc.it/en/
London IOOC 10-May https://www.londonoliveoil.com/
Italy IOOA 15-May https://www.italyiooa.com/
Terra Olivo 30-May https://terraolivo-iooc.com/competition/
LODO 05-Jun https://www.lodo-guide.com/
BRIOOC 15-Jul https://braziliooc.com/
Flos Olei 31-Jul https://www.flosolei.com/
Olivinus 01-Aug http://www.olivinus.com.ar/_SP/index.php
AVPA (França) 15-Aug https://pt.avpa.fr/huiles
NYIOOC 01-Oct https://support.nyiooc.org/
CIOOC (Canadá) 30/04 – 10/05 https://canadaiooc.com/your-brand-registration/
Scandinavian IOOC A ser anunciado https://scandinavianiooc.com/
US IOOC A ser anunciado https://usiooc.com/judges/
The Afro Asian IOOC A ser anunciado https://aaiooc.com/

Competição com datas já encerradas

Expoliva – Espanha
LA IOOC – EUA
Mario Solinas – Espanha
Zurich Olive Oil Awards – Suiça
EVOOLEUM – Espanha
Ovibeja – Portugal
CINVE – Espanha
JOP – Japão

E os dois baguais perdidos em Nova Iorque?

Voltando ao 10 de maio e aos dois baguais perdidos em Nova Iorque – Rafael e eu. Nós saímos da cerimônia de premiação por volta das 22:00 e queríamos jantar para comemorar o prêmio do Prosperato. Tentamos ir à Little Italy, e já não havia um restaurante aberto. Morrendo de fome, fomos parar num McDonalds e celebrarmos o prêmio com dois hamburgueres, alface e molho especial no pão com gergelim. Mas muito felizes!

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Coisas que não dá para engolir

Colheita azeite Costa Doce, 2019. Foto: Wesley Santos/Agência PressDigital

Azeite rançoso, vinho azedo e leite adulterado são produtos difíceis de engolir. No Brasil, os últimos trinta anos marcaram uma grande evolução na qualidade de alguns produtos. Nossos azeites ganham prêmios internacionais, nossos vinhos são respeitados e nossos queijos fazem sucesso até na França. A abertura do mercado brasileiro para importação na década de 90 ampliou nosso referencial de qualidade e serviu como inspiração para o aperfeiçoamento de algumas categorias de produtos.

Nesses últimos 30 anos, aprendemos também que não basta prestar atenção à qualidade de um produto. É preciso prestar atenção à qualidade do produtor e da cadeia produtiva. Em 1990, diversos ativistas expuseram a presença de trabalho infantil nas fábricas que produziam calçados para a Nike no Oriente. Na época, começava a aumentar a pressão para que empresas tivessem maior “responsabilidade social”.  Era uma questão simples, com uma lógica que eu acho fácil de entender: faz sentido uma empresa promover os esportes, lucrar bastante a ponto de oferecer patrocínios milionários a atletas, cobrar caro pelos seus produtos e fechar os olhos para o fato de que crianças, que deveriam estar na escola, trabalhavam em suas fábricas?

A Nike teve que se posicionar, mudou práticas de contratação de fornecedores e a história se tornou emblemática. Muitas outras empresas tiveram as suas cadeias expostas (no Brasil, por exemplo, Zara e Lojas Marisa) e em comum a todos os casos, estava a resposta: “A culpa é da empresa para quem terceirizamos a produção. A gente não sabia de nada”. Tênis bonito, roupa estilosa, e desculpa esfarrapada.

O conceito de “responsabilidade social” foi se transformando e hoje corre no mercado pelo nome de ESG (Environmental, Social and Governance). A seriedade com que as empresas adotam as práticas ESG é bastante variável. Há todo um mercado de consultoria em volta disso e muita discussão acadêmica, mas é possível resumir o assunto sob uma perspectiva ética. É correto que uma empresa tenha lucro. Lucro é a justa remuneração de um produto ou serviço oferecido para a sociedade. Já a exploração de pessoas de maneiras degradante é algo que começou a cair em desuso, pelo menos do ponto legal, desde que a escravidão foi abolida no Brasil há 135 anos. Durante esse tempo, que é mais curto do que parece, tem aumentado a percepção de que algumas coisas são difíceis de engolir, como a desculpa de que não se sabe o que aconteceu com uma empresa terceirizada na sua cadeia produtiva.

A postura inaceitável das vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi no caso dos trabalhadores encontrados em situação análoga à escravidão me acendeu um alerta: poderia acontecer o mesmo na indústria de olivicultura brasileira? Eu tinha alguns elementos para acreditar que não, mas preferi confirmar minhas hipóteses conversando com o Renato Fernandes, presidente do Instituto Brasileiro de Olivicultura, e com o Luiz Eduardo Batalha, maior produtor de azeites brasileiros.

De acordo com a EMBRAPA, as plantações de uva ocupam 78 mil hectares no Brasil. Só isso dá uma noção da intensa demanda de mão de obra concentrada em períodos específicos do ano. Já os olivais, cuja safra se concentra nos meses de fevereiro e março, ocupam pouco mais que 7 mil hectares. Isso torna a operação de colheita mais gerenciável. O maior produtor, azeites Batalha, contrata no máximo 100 trabalhadores extras para este período. Operações em escala demandam maior atenção e protocolos mais rígidos. No caso das uvas, aparentemente sequer havia protocolo para tratamento de terceirizadas e trabalhadores.

A maior parte dos produtores de azeite possui pequenas propriedades, e a colheita é feita pelos funcionários, familiares e amigos. A contratação é feita diretamente e não há terceirização de mão de obra. O azeite Nina, por exemplo, que acabou de receber a primeira certificação de azeite orgânico do Rio Grande do Sul, é produzido numa propriedade de 4 hectares, com 1.000 árvores. A proprietária, que colheu 20 toneladas nesta safra de 2023, além da família, contratou seis trabalhadores locais, na cidade de Rosário do Sul.

Colheita da safra 2023 do Azeite Nina. Foto: acervo da produtora

A contratação de trabalhadores locais parece ser uma regra do setor da olivicultura. Luiz Eduardo Batalha, maior produtor individual de azeite no Brasil, e um dos primeiros a colocar seu produto em lojas de varejo, chega a contratar 100 pessoas, além dos 40 funcionários fixos da propriedade. Os trabalhadores são contratados em parceira com o SINE (Sistema Nacional de Emprego) e com a prefeitura de Campos Machado, que fornece os ônibus para transporte. Os trabalhadores recebem refeições e há banheiros químicos em todo o olival. Desde o início da pandemia, o Batalha aperfeiçoou o sistema de turnos, evitando inclusive que os grupos da manhã e da tarde tenham contato. Ou seja, há um protocolo para a contratação.

A produção brasileira de azeite é responsável por menos de 1% do consumo de azeite no país. Quando escrevi a primeira edição do Extrafresco: O guia de azeites do Brasil, em 2017, não havia mais que 30 marcas no mercado. Na edição mais atual (à venda na Casa Santa Luzia ou na Livrobits), já há 118 marcas e, para o próximo ano, o número pode passar de 150. Há um consenso, formado até mesmo por experts internacionais, de que estamos no caminho certo. Ana Carrilho, azeitóloga portuguesa responsável pela elaboração dos azeites da Herdade do Esporão, esteve no Brasil em fevereiro para acompanhar a extração do azeite em alguns lagares e comentou comigo: “É bonito ver quanta paixão há nos produtores brasileiros pela produção de azeites”.

Embora as evidências que eu encontrei tenham sido positivas, é bom que o segmento de olivicultura fortaleça os protocolos relacionados à contratação de funcionários. De acordo com Fernandes, presidente do IBRAOLIVA, todos os associados são orientados a trabalhar de acordo com as normas trabalhista vigentes. Com um número crescente de produtores e o amadurecimento dos olivais, a demanda por mão de obra irá crescer. Isto implica na necessidade de protocolos éticos e rígidos para evitar que um bom azeite esconda o gosto rançoso de uma má prática trabalhista. Se isso acontecer, já ficamos combinados: não vai dar para engolir uma resposta do tipo “eu-não-sabia”.

Azeite brasileiro: retrospectiva 2022

O número de marcas nacionais quintuplicou

Extrafresco: O Guia de Azeites do Brasil 2022-2023

Em abril de 2022, eu tinha identificado 110 marcas de azeites produzidos no Brasil. Entre abril e agosto, quando finalizava a redação do Extrafresco: O Guia de Azeites do Brasil, esse número tinha chegado a 150. Com os originais já em gráfica, nem havia mais tempo de incluir novos produtores no guia, que fechou com a resenha de 118 marcas. Em 2017, a primeira edição apresentava ao consumidor 28 marcas. Em 5 anos, portanto, vemos um crescimento de quase 500%, com azeites originários da Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

O Espírito Santo tem azeite para a moqueca

Dia de Campo em Pedra Azul – ES, organizado por Fabrício Rezende.

Conhecido pelos seus cafés de alta qualidade, o estado do Espírito Santo desponta como um potencial produtor de excelentes azeites. Este ano, Aracê e Quinta do Manacá já comercializaram seus azeites, ainda que em pequena escala. A Olives, associação de produtores do estado, também produziu um lote a partir das azeitonas dos seus associados. Ao todo, são 288 hectares e 144 produtores em 18 municípios. Se a Bahia tem dendê para sua moqueca, não vai faltar azeite para a moqueca capixaba.

O Rio Grande do Sul tem azeite para todo mundo

RS Innovation Stage na Expointer 2022

A safra de 2022 rendeu 448,5 mil litros de azeite no Rio Grande do Sul, de acordo com a Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural. É maior produção registrada até agora. Além da entrada de novos olivais em produção, técnicos e agrônomos afirmam que novas tecnologias auxiliaram no aumento da produtividade. O estado destaca-se pelo forte incentivo público, com a participação da Secretaria de Inovação, Tecnologia e Ciência (SICT) atuando também no desenvolvimento da cadeia. Fui convidado pela SICT para uma palestra na Expointer 2022, cujo auditório estava lotado de gente interessada em olivicultura.

O Brasil é reconhecido internacionalmente

Antonio Lauro, do EVO IOOC, entrega prêmio de melhor da América do Sul para Chris Vogt, do azeite Milonga

O Extrafresco 22/23 já estava na gráfica e continuavam chegando notícias de premiações internacionais para os azeites brasileiros. Em que pesem as limitações metodológicas de algumas competições, a conclusão geral é: sabemos produzir azeites de qualidade e somos reconhecidos em todo o mundo. Destacam-se o Sabiá, que ficou entre os dez melhores azeites do mundo no prestigiado ranking espanhol Evooleum – a primeira vez que um azeite brasileiro alcança este posto e o Milonga, reconhecido pelo EVO IOOC, na Itália, como o melhor azeite do Hemisférioo Sul.

Selos começam a orientar o consumidor

Seleção do Selo Produtos Premium em Porto Alegre

Com o crescimento do mercado, é natural que seja necessário um maior controle da qualidade. Para além do ufanismo oba-oba-olha-que-legal-temos-azeite no Brasil, é preciso garantir que este azeite tenha um bom padrão de qualidade.  Atento a isso, o Instituto Brasileiro de Olivicultura (Ibraoliva), em parceria com a SICT-RS, lançou neste ano o Selo Produto Premium, com critérios técnicos e sensoriais. Dividi com o colega Marcelo Scofano a condução da prova dos azeites, que ao final concedeu o selo para 29 marcas gaúchas. No Sudeste, a Assolive (Associação dos Olivicultores dos Contrafortes da Mantiqueira e Sudeste) também criou um selo de de origem certificada, que precisa ser renovado a cada ano. Os critérios específicos de cada selo estão no Extrafresco: o Guia de Azeites do Brasil 22/23.

Produtores brasileiros investem em gestão ambiental

Energia solar para 100% da operação do lagar da Fazenda Irarema

É um consenso mundial de que o Brasil tem potencial para liderar soluções ambientais que ajudem a mitigar eventos climáticos decorrentes do aquecimento global. Durante as entrevistas para o Extrafresco, este tema surgiu de maneira bem mais evidente que nos anos anteriores. O Lagar H investiu tanto na certificação de Empresa B como na certificação LEED para edificações sustentáveis. Marcas como Nina, PurOliva, Verde Oliva, Vikaz e ZET oferecem azeites orgânicos, biodinâmicos ou de mínima intervenção.

Corre que o MAPA vem aí

Laboratório móvel de análise do MAPA

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), intensificou a investida contra azeites importados e com suspeita de fraude. Desde 2017, o controle sobre fraudes tem se intensificado e conta agora com um laboratório de análise sensorial reconhecido pelo Conselho Oleícola Internacional. Nunca tivemos uma ação tão efetiva para coibir a venda de azeites de baixa qualidade. O efeito foi imediato: compradores de redes de varejo afirmam que já notaram maior preocupação no exterior com a qualidade do azeite exportado para o Brasil.

Novo livro com a história do azeite brasileiro

Azeite-se, de Ana Beloto

A azeitóloga Ana Beloto lançou, em abril de 2022, o livro Azeite-se, que faz um belo registro histórico da olivicultura no Brasil, com fotos inéditas e receitas com a consultoria gastronômica de Pedro Frade, chef brasileiro que figura no ranking da Forbes 2022 de brasileiros mais influentes com menos de 30 anos.

Mais pontos de distribuição para o azeite brasileiro

Loja da Estância das Oliveiras, no Cais Embarcadero em Porto Alegre – RS.

Está entre as cinco perguntas que mais ouço quando falo de azeite brasileiro: “por que eu não encontro esse azeite no supermercado?”. Apesar de marcas como Batalha já estarem presentes no varejo há um tempo, o azeite brasileiro ainda é um produto de nicho, com distribuição fragmentada. Mas pouco a pouco, novos canais começam a surgir. Duas novas lojas prometem se juntar ao tradicional Empório dos Azeites de Gramado. Em São Paulo, acaba de ser inaugurada, pela chef Pérola Polillo, a Azeite Experience, uma loja charmosa no mercado de Santo Amaro. Em Porto Alegre, faltam apenas últimos ajustes para a loja do azeite Estância das Oliveiras no Cais Embarcadero. Desde janeiro, a BRME, uma loja online especializada em vinhos, destilados, cafés e chocolates produzidos no Brasil me procurou para fazer uma curadoria de azeites nacionais. Além disso, também é possível encontrar na Braz Pizzaria um ótimo azeite selecionado pela Ana Beloto e produzido pelos azeites Batalha.

Lançamento do Extrafresco: o Guia de Azeites do Brasil 2022/2023

Extrafresco: O Guia de Azeites do Brasil 2023-2024

Pelo sexto ano seguido, provei pelo menos uma variedade de azeite de todos os produtores nacionais e, em outubro, ficou pronta a quarta edição do Extrafresco: O Guia de Azeites do Brasil 2022/2023. Assim como em 2018, fiz questão de que essa edição fosse bilíngue, para aumentar a repercussão da nossa qualidade. O guia apresenta 118 marcas (de um total de 150), com notas de degustação, receitas e dicas de passeio por olivais, outro ponto de destaque da olivicultura nacional. É possível comprar o guia no site da editora Livrobits.

O azeite se junta ao café, aos queijos, cachaças e vinhos brasileiros cada vez mais reconhecidos. É motivo para celebrar com um brinde. E se acompanhar algum aperitivo, não precisa ser um fio – pode ser um rio de azeite.

O melhor azeite trufado

Imagine alguém que nunca experimentou um morango de verdade. Só conhece o seu sabor por meio de balas, iogurtes e suco artificial. Aliás, esse alguém pode até ser você mesmo, se for brasileiro. Morango não é uma fruta nativa do Brasil. O clima e o solo nem sempre contribuem para uma boa expressão dessa fruta. Ela é sensível, muitas vezes colhida e consumida naquele estágio de maturação em que tanto faz se é morango, pêssego ou tomate – sempre vai ter o mesmo gosto de fruta verde.

Se você só conhece morangos por meio do aroma e sabor artificial acrescentado a produtos, pode estranhar muito quando provar um morango de verdade. Carnudo, suculento, com uma leve crocância das sementes. E muito aromático (avance para o final do texto se quiser saber como potencializar o aroma dos morangos). Eu citei o “carnudo”, “suculento” e “crocante” porque nossa percepção de sabor dos alimentos é altamente influenciada pela sua textura e aparência. Já pensou como seria o espaguete ao sugo se os tomates fossem brancos?

Mas este texto não é sobre morangos. É sobre trufas e azeites trufados. Trufas são fungos raros que nascem em algumas regiões da Europa. Há cachorros e porcos especialmente treinados para caçá-las na época certa do ano. Pretas ou brancas (essas últimas mais aromáticas), sempre foram associadas a luxo e riqueza e aparecem prodigamente em cardápios da nobreza dos séculos XVIII e XIX. Seu aroma intenso é fugaz e e dura poucos dias, depois de retiradas da terra.

Cesta de morangos da Fazenda Irarema

O preço do quilo de uma trufa branca de Alba, na Itália, pode chegar a quatro mil dólares. Como todo produto caro e cobiçado, há toda uma indústria por trás à caça de gourmets incautos. Nos bons restaurantes que as servem, já não são usadas como recheio de aves, algo comum nos cardápios de Escoffier da virada do século XIX para XX. São laminadas sobre uma balança e freguês paga entre cinquenta e cem dólaares dólares para poder dizer (e postar nas redes sociais) que comeu um comida rara

O perfume das trufas

Mais do que um alimento, as trufas são um perfume (fungada cara, não?).  Tanto que recomenda-se seu consumo com pratos muito simples, como talharim ou um prosaico ovo frito, para evitar excesso de informação.

Esse aroma é composto por centenas de moléculas aromáticas. Uma dessas moléculas, cujo nome é 2,4-ditiapentano, pode ser sintetizada em laboratório. Esse composto, cujo aroma é descrito como sulfuroso, é o principal elemento adicionado a azeites trufados. Como todo componente sintético, do ponto de vista aromático ele é unidimensional. Ou seja, não pode dar conta de toda a interessante complexidade aromática de uma verdadeira trufa. É como a baunilha sintética, extraída a partir de um composto do petróleo, e que é apenas uma lembrança da baunilha verdadeira.

Por que trufas combinam com azeite?

Assim como toda gordura, o azeite é um condutor de sabor. Ele, por sua vez, também acrescenta seu próprio sabor aos alimentos. É natural, portanto, que alguém, um dia, tenha tido a ideia de acrescentar trufas à garrafa de azeite para deixar seu aroma ainda mais interessante. Era também uma forma de se tentar preservar ao máximo o aroma evanescente da trufas.

Dessa ideia, decorrem dois problemas. O primeiro é que qualquer elemento introduzido no azeite pode acelerar a sua degradação. É por isso que azeites filtrados tem maior durabilidade que não filtrados. O processo de filtragem elimina as micro-partículas sólidas que poderiam fazer o azeite envelhecer mais rapidamente. O segundo problema é que, assim como alguém teve a ideia de misturar trufas ao azeite para potencializar seu sabor, outro alguém teve a ideia de acrescentar trufas para tentar disfarçar o aroma de azeites já cansados ou rançosos.

O mito do azeite trufado

Com a descoberta da síntese em laboratório do 2,4-diapentano, ficou fácil produzir azeite trufado sem pagar caro pelas trufas. Ninguém, em sã consciência, coloca 10 gramas de trufas, pelo preço de setenta dólares, numa garrafa de azeite. Eu, por exemplo, preferiria poupar este valor para um dia comprar uma passagem para a Itália durante a temporada de trufas em Alba. Ainda assim com muita cautela para não ser enganado por vendedores de falsas trufas chinesas ou espanholas (cogumelos de qualidade inferior banhados em… azeite trufado!)

O risco de consumir o azeite trufado é você nem apreciar as sutilezas do sabor de uma trufa quando provar uma verdadeira. Muita gente tem dúvida se gosta daquele aroma esquisito que incendeia o restaurante quando o garçom traz o prato, mas consome porque acredita que está arrasando e comendo algo chique. O principal problema do composto sintético é que ele não representa adequamente o aroma de uma trufa, assim como um alimento “sabor morango” não reproduz o aroma de um bom morango. Pode consumir o azeite trufado? Pode. É de bom tom? Não é. Prefira gastar seu dinheiro com azeite extravirgem de alta qualidade.

Dica #umriodeazeite

Quer tornar o seu morango muito mais saboroso? Além de comprar na estação correta, não consuma a fruta gelada. Deixe-a à temperatura ambiente. O frio inibe as moléculas voláteis que contribuem para o aroma de morango.

Dois produtores brasileiros de azeite também plantam morangos e permitem aos visitantes colher direto do pé.

Em Maria da Fé – MG, a Fazenda Maria da Fé tem um gostoso restaurante ao lado da plantação de morangos.

Em Poços de Caldas – MG, a Fazenda Irarema, premiada internacionalmente pela qualidade dos seus azeites, importou mudas de morango da Espanha. Você compra uma cesta e colhe seus próprios morangos. A fazenda oferece um passeio pelos olivais e um fantásstico brunch com muito azeite aos domingos. Os morangos podem ser colhidos de fevereiro a setembro e estão no auge do sabor em junho e julho.

Saturado

Às 05:15 da manhã, o enfermeiro veio retirar meu cateter intravenoso, um tubo fino de trinta centímetros, instalado na dobra interna do braço e que segue por dentro da veia, até o coração. Em casos de longa internação, ele evita que o paciente seja picado várias vezes ao dia ao receber medicamentos e coletar exames. É o último passo para receber alta, após dezessete dias internado em tratamento de COVID.

Antes disso, tinha passado um ano e meio me cuidando da maneira mais responsável possível, com a sorte de poder trabalhar de casa em tempo integral. Deixei de receber amigos, para quem tanto gosto de cozinhar. Cheguei a me indispor com a família num momento em que queriam me visitar e eu disse que só receberia visitas vacinadas.

E então, eu saturei de tanto isolamento. Uma semana antes da data prevista para minha vacinação, resolvi visitar um amigo. Ele, sem saber, já estava contaminado. Voltei para São Paulo, testei positivo e vim parar na UTI.

Na UTI, você luta para controlar a inflamação e recuperar a saturação de oxigênio. O barulho dos monitores bipando é constante. O zumbido do oxigênio passando pela máscara lembra uma longa noite insone em vôo internacional quando as horas não passam e você fica esperando o café da manhã. Quando finalmente adormece, chega a equipe de raio-x e coloca uma placa gelada nas suas costas. E novamente a equipe de enfermagem e fisioterapia para checar seus sinais. A equipe de limpeza, quase invisível mas barulhenta. E a equipe de nutrição que verifica se você quer purê ou purê.

Prostrado, porém consciente, ocupava meu tempo fazendo diagramas mentais desenhando um percurso desde esta parte visível da equipe até os anônimos que fazem tudo funcionar. Para que o remédio e o purê cheguem na hora certa, alguém está numa sala sem janelas preenchendo formulários e fazendo cotações. Comprando de seringa à mandioquinha. Estimando quantos milhares de aventais, descartados minuto a minuto, serão usados no dia. No laboratório, uma equipe processa os exames colhidos de madrugada para que os médicos possam acompanhar a evolução do paciente logo pela manhã. Dar conforto e salvar vidas é uma operação complexa de processos, máquinas e gente.

Desconfiei que ia ser entubado quando, de repente, não veio meu purê. Tinha sido colocado em jejum preparatório. No final, não foi necessário realizar o procedimento. Vi nos olhos da equipe o orgulho de ter revertido a situação. Orgulho de salvar uma vida – que valor tem isso?

Entendi melhor, então, algo que vem me saturando há um tempo: a atenção e valor desmedidos, irracionais e irresponsáveis que se atribuem a celebridades fazendo dancinhas em redes sociais, se chacoalhando por alguns trocados e recebidos.

Antes de mais nada, preciso dizer que também tenho meus momentos fúteis. A vida precisa de respiro. Não passo 24 horas estudando física quântica ou treinando abrir massa de strudel. Como miojo e assisto a séries inúteis. Mas não espero ser reconhecido nem valorizado por isso.

Reconhecimento merece alguém que, às 4 da manhã, se aproxima sorrindo de um paciente de mau hálito, recolhe sua urina, sem antes deixar de anotar a quantidade de mililitros. Alguém que dá banho em um desconhecido e diz uma palavra de encorajamento (“nós vamos cuidar do senhor, viu?”). Que comemora sua saída da UTI como se você fosse da família. Gente que, no céu, vai ter um canto especial com massagem, espumante e pão com azeite da melhor qualidade. Mas que aqui neste planeta não está valorizada o suficiente. Porque, de repente, naquilo que só pode ser um surto coletivo, decidimos colocar no centro do palco um bando de picaretas digitais.

Após a retirada do meu cateter, arrumei minha mochila. Acompanhei o nascer do sol no vale do Pacaembu, com a vista que tenho do oitavo andar do Instituto do Coração. Fiz uma oração de agradecimento por todos. E não espero que ninguém curta o que escrevi. Estou saturado de influencers e me ofendo se você me chamar disso.

Não tive alterações no olfato nem no paladar, o que era um grande medo. Fiquei internado no Instituto do Coração em SP, cuidado por uma equipe competente, carinhosa e sorridente. Deixo a todos minha gratidão e reconhecimento.

Equipe da nutrição que atrasou meu almoço duas vezes e quase me matou de fome: eu perdoo, sei que estão todos muito ocupados. E desculpem-me por devolver aquilo que se passa por molho italiano em um sachê de plástico. Eu trouxe escondido na mochila um monte de vidrinhos de azeite. Minha vida ficou por um fio mas não abri mão do meu rio de azeite.

Máscara de azeite, o segredo da pele bonita

“Tudo o que eu sou devo às massas”, disse Sophia Loren uma certa vez.  Mas essa pele, na era pre-Photoshop, tinha outra explicação, além da genética. O uso de azeite como cosmético é sabedoria ancestral, muito antes que a ciência identificasse a presença do hidroxitirossol, um polifenol com ação anti-oxidante. Dizem que a Cleópatra usava no corpo todo. E que Sophia Loren, por via das dúvidas, usava na salada, no rosto e no banho.

A receita a seguir é do livro “The Passionate Olive: 101 Things to Do with Olive Oil”, da Carol Firenze, que a aprendeu de sua professora de culinária na Toscana. Aproveite que de janeiro a maio é tempo de abacate, fruta que fica ótima com pão tostado, azeite, sal e limão. Mas como é muito calórica, você pode aproveitar parte dela para fazer uma máscara facial.

Máscara facial com azeite

Amasse ½ xícara de azeite extravirgem com uma xícara de abacate. Quando a mistura estiver homogênea, aplique no rosto e deixe por 12 minutos. A promessa da Carol é a de uma pele brilhante.

Carol Firenze promete que a pele fica iluminada. Aproveite a quarentena para deixar a pele mais bonita. E se tiver que sair de casa, use máscara.

Um bom pão é uma forma de oração

Não consigo acordar tarde e tenho aproveitado o início da manhã para assar pães. Um bom pão é uma forma de oração. Dez minutos de sova e depois esperar o milagre do crescimento. Enquanto isso, pratica-se a paciência. É possível resolver isso rapidamente indo à padaria da esquina. Mas o que fazer com o tempo que sobra? Estamos reaprendendo a lidar com o tempo e eu prefiro meditar enquanto faço o pão.

Uso a técnica da minha mãe. Uma pequena bolinha de massa em um copo d’água. Quando ela flutua, é sinal de que o pão cresceu e está pronto para ser modelado. Eu podia olhar no relógio. Eu podia ligar o cronômetro do forno. Mas faz parte da oração lembrar da minha mãe. Que não tinha cronômetro, tinha seis filhos para cuidar e, provavelmente, dependia desse truque visual para não se perder em meio a tanto trabalho que tinha na casa. Enquanto sovava os pães hoje cedo, lembrei da varanda do fundo da casa onde eu, às vezes, ajudava a passar os pães no cilindro. Ficava intrigado de como ela sabia quando o pão já estava cilindrado o suficiente. Nunca perguntei. Agora não tenho mais como saber.

Tentei hoje cedo fazer pães parecidos com os da Vó Armelinda, avó da minha esposa. Claro que não vão ficar iguais. Modelar um pão corretamente é uma arte que leva muito tempo para se aperfeiçoar. Eu preciso de uma balança de cozinha para dividir a massa em porções iguais. A Vó Armelinda fazia “de olho” e assava fornadas de três ou quatro assadeiras de pães simetricamente modelados. Qualquer dia eu volto aqui para contar a história de quando achei que já estava meio caduca e tinha errado na receita do pão. Quem errou e levou bronca, nesse dia, fui eu. Vó Armelinda partiu faz uma semana e fez parte da minha oração de hoje.

Enquanto aguardo os pães crescerem, lembrei de um texto que escrevi em janeiro de 2012, época em que comecei a me aventurar a fazer pães de fermentação longa (afinal, orações podem ser curtas ou longas e precisamos de todas nesse momento).

Um pão assado na madrugada enche a casa de paz. Como uma oração.

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O texto abaixo foi publicado originalmente em 29 de janeiro de 2012 no umlitrodeletras.com.br.

Tirei os pães do forno e deixei descansando na grade. Peguei um livro, sentei no sofá – de repente, escuto um ruído na cozinha – são os pães cantando baixinho, como se fizessem uma oração.

Depois que você, a duras penas, aprende a domar a farinha, a água, a umidade (inconstância, teu nome é umidade!) e o fermento, descobre que ainda há outra arte por vir. Modelar pães não é uma tarefa banal.
Meus pães não estão bem modelados. Têm vergonha de mostrar seu traseiro, costurado e remendado pelas minhas mãos inábeis. Mas mesmo assim acordam corados, saudáveis, felizes e cantando baixinho para não atrapalhar o silêncio do domingo. Depois pedem um pouco de manteiga, uma xícara de café. E eu largo o livro e vou conversar com eles.

(Tente fazer a mesma experiência com pão de forma comprado no supermercado. Periga ele sair do saco plástico recitando preço de ações e a cotação do trigo na bolsa de commodities de Chicago. E ainda por cima tem nojinho da manteiga e diz que só se dá bem com peito de peru light. Não conversa, não canta, não sabe nem que é domingo. Um pagão.)

 

Quatro dicas para divulgar melhor o seu azeite

A comercialização do azeite brasileiro é um dos pontos frágeis da cadeia da olivicultura. Não há distribuidores formados, nem vendedores e consumidores informados. Por isso, não dá para desperdiçar nenhuma oportunidade de divulgação. É muito difícil conseguir espaço nos meios de comunicação para divulgar uma marca. Mas depois de duas décadas trabalhando com comunicação de temas complexos, aprendi algumas coisas que podem ajudar.

Lembrei de compartihar essa dicas porque passei as últimas seis semanas praticamente em quarentena para escrever a edição 2020 do Guia de Azeites do Brasil. Imagine que o único custo que um produtor tem para participar do guia, que terá uma ampla tiragem e distribuição em todo o Brasil é enviar uma amostra de 100 ml de azeite para eu escrever uma nota de degustação. Além disso, tem que dedicar uns 15 minutos para responder um questionário online. A principal pergunta é: “O que o seu azeite tem de especial?”. A partir dessa resposta eu consigo escrever um texto. Tem gente que abre o coração e, mesmo com o limite de seis linhas, até eu me emociono com o resultado final. E tem gente que, bem nessa pergunta, responde com uma palavra: “Tudo.”

De fato, é um ato de perseverança cultivar oliveiras no Brasil. Como esse texto é dedicado a produtores e não a consumidores finais, nem vou entrar em detalhes sobre os desafios de cada etapa da produção, que todos conhecem. Aliás, há 15 dias dei uma palestra sobre construção de marcas no 15º Dia de Campo da EPAMIG, em Maria da Fé – MG e me surpreendi que 60% da plateia era de interessados em iniciar essa trajetória. Bem-vindos. E façam a lição de casa usando essas dicas.

Voltando ao produtor que respondeu: “Tudo”. Sim, ele investiu todo o dinheiro e esforço que tinha para chegar no lote de 1.000 garrafas que produziu. Ele quer vender essa azeite para, no mínimo, reinvestir no próximo ano (nem vou falar de lucro, que foi o tema da ótima palestra da Ana Beloto e do Paulo Freitas no dia de campo). Mas não é falando do seu esforço que o consumidor vai ficar com dó e preferir sua marca. Não é falando que seu azeite é tudo de bom que o consumidor vai acreditar. Lembre-se, todos os outros produtores estão falando a mesma coisa.

Se alguém te procurar para divulgar sua marca, preste atenção nos pontos a seguir:

Dica 1: Tenha tudo na mão.

Do outro lado da mesa, tem uma pessoa cumprindo prazos para publicar. Se você tiver tudo na mão, a chance de ela falar de você é maior. Até você ligar para sua agência de marketing para pedir uma foto, o comunicador do outro lado já encontrou outro produtor que tinha tudo na ponta do dedo (dedo, claro, higienizado com álcoo gel).

Dica 2: Organize seu material.

A gente chama isso de press kit. Fotos da garrafa de azeite, fotos do olival e um texto descrevendo você. Fotos em alta resolução, não adianta mandar foto de celular. Para as garrafas, é legal ter duas alternativas: uma da garrafa em fundo neutro, sem enfeites, outro mais produzida. WhatsApp pode parecer prático, mas se você estiver falando com mídia impressa, envie por e-mail, porque o WhatsApp comprime as imagens e as inutiliza para impressão. Uma boa dica: deixe tudo já organizado num diretório virtual e compartilhe com o jornalista. Uma dica masterplus: deixe todas as imagens e todos os arquivos nomeados com o nome da sua marca. Por exemplo: foto_azeite_tesouro.jpeg. Isso facilita a conferência de quem está recebendo (imagine receber 10 fotos de produtores diferentes todas com o nome olival01.jpeg).

Dica 3: Indique onde seu azeite pode ser comprado.

Não economize nessa parte, nem tenha preguiça. Faça uma lista bem feita. Deixe em lugar bem evidente no seu site e envie também para o jornalista. Coloque endereços completos. Se possível, coloque o endereço dos sites. Usando novamente o exemplo do Guia de Azeites: tem gente que responde: “Em lojas especializadas”. Não é uma resposta que ajuda muito. Você quer mesmo vender o seu azeite ou, por causa de todo o trabalho para produzi-lo, quer guardar tudinho para você? Vou repetir: do outro lado tem alguém com pouco tempo para cumprir o prazo de entrega de uma matéria.

Dica 4: Saiba contar a sua história.

Se sua marca deixasse de existir, quem sentiria a falta dela? Essa pergunta é meio dura, mas verdadeira. As pessoas compram produtos mas também compram histórias. E não adianta falar (apenas) sobre o incrível índice de acidez livre abaixo de 0,1% do seu azeite. Tem mais azeites no mercado com esse índice também. O mesmo vale para todos os outros atributos técnicos. Tem algo que só existe na sua marca. Você precisa descobrir e treinar bem para falar desse “algo”. Quando você o descobrir, terá um gancho para contar sua história que fará todos prestarem atenção nela. Se a história for muito boa, as pessoas vão se encarregar sozinhas de passa-la adiante. É assim que funciona um vírus.

Agora arregace as mangas, lave as mãos e aproveite agora sua quarentena e comece a preparar seu material. Toda essa confusão vai passar e a gente vai ter que estar preparado para vender nosso azeite.

(A imagem que ilustra esse post mostra o poder de disseminação de um vírus e a importância da quarentena para evitar maior contágio).