Senta que lá vem história

Era uma vez um país em que chegou um português, arregalou os olhos e escreveu: “Em se plantando tudo, dá!”. O país plantou cana-de-açúcar e deu tanto que adoçou toda a Europa. Plantou café e deu tanto que exportou energia para todo o mundo. Já oliveiras não plantou, porque os portugueses não viam com bons olhos a concorrência com seus azeites e espalhou-se a lenda de que tudo dava mas oliveira não. O país passou alguns séculos importando azeite (enquanto isso, plantava milho, soja e exportava frango e porco).

Há pouco mais de uma década, alguns agricultores decidiram desafiar o senso comum e pouco a pouco começaram a implantar olivais em regiões mais frias do país. Descobriram que, pelo contrário, as oliveiras que são provenientes de climas mais áridos e solos mais pobres, até cresciam demais por aqui.

A partir de 2006, começara a extrair azeite em terras brasileiras. Desconfiada, muita gente perguntou: “Mas azeite brasileiro é bom mesmo? O melhor azeite não é o português, o grego, o italiano?”. Como mostrar que esse azeite era bom? Os olivicultores começaram a mandar amostras para competições internacionais. Ganha-se um prêmio aqui, dois acolá, cinco na Itália, onze em Nova Iorque e pronto: temos a confirmação de que em se plantando, tudo dá e ainda fica muito bom. Dá um trabalho enorme  — só quem plantou as árvores e ficou cinco anos esperando frutificarem sabe — mas dá.

Por que é importante um concurso de azeites brasileiro

No encerramento do concurso debatemos eu, Marcelo Scofano, azeitólogo do RJ e Edgardo Pacheco (autor do livro 100 Melhores Azeites de Portugal) — também participou da conversa professora Isabel Kasper, do RS.

Nesta segunda semana de agosto do ano da graça de 2019, mais uma vez fizemos história: foi realizada a primeira competição internacional de azeites sediada no Brasil. O que significa isso para o azeite brasileiro?

  • estamos definitivamente no circuito internacional de regiões reconhecidas não só como produtoras, mas com gente apta a avaliar e reconhecer os melhores azeites do mundo. O concurso avaliou 93 azeites de 7 países diferentes. Entre eles Peru, Líbano, Portugal e Espanha.
  • foi a primeira vez em que se reuniram os principais profissionais brasileiros capacitados para degustar azeites. Muitos se conheciam, mas nunca tinham estado juntos na mesma sala, provando os mesmos azeites. Essa calibração é bastante importante, já que esses profissionais estão o tempo todo em contato com os produtores. Isso ajuda não só a alinhar-se com o padrão internacional, como a afinar a percepção de características próprias dos azeites brasileiros.
  • a avaliação profissional e sistemática dos azeites influencia um ciclo positivo de melhora de qualidade em toda a produção.

Mas quem ganhou?

Se você leu o bloco acima atentamente, já chegou à conclusão de que todos os produtores e consumidores brasileiros sairam ganhando. Foi emocionante julgar os azeites e torcer pela presença de brasileiros entre os premiados. O grande ganhador foi o azeite português Quinta dos Paços, mas quatro azeites gaúchos figuram na lista dos top ten. São eles:

O Capolivo está em seu segundo ano. Eu já tinha experimentado o azeite em 2018 e há uma diferença notável na safra de 2019. Não só está entre os melhores, mas ainda levou o Best of South America. O La Pataca foi extraído no lagar da Olivas do Sul, que figura com um monovarietal nos top ten, mas teve também outros quatro azeites premiados, o que atesta a competência da equipe que está fazendo a extração em Cachoeiras do Sul. O Prosperato é um produtor brasileiro que tem consistentemente ganhado prêmios no exterior.

E onde eu encontro?

Jeito mais fácil de encontrar: compre pelo site dos produtores E atenção: a lista acima é só a dos top ten. Há outros ótimos azeites com medalhas de ouro, prata e bronze, como se vê na lista abaixo (a lista completa incluindo os azeites estrangeiros está disponível no site do Brazil IOOC.

Um estreante na lista do melhores

Quando, no minuto final do júri, o presidente anunciou os dez melhores, todos ficaram surpresos com o azeite La Pataca. Quem é esse brasileiro que ninguém do grupo conhecia? Mal cheguei em casa, fui correndo procurar o contato do produtor. Liguei para ele, Rodrigo Sgorla, e batemos um papo ao telefone.

Rodrigo está localizado na cidade de São Francisco do Sul, nos campos do alto da serra gaúcha, região que ninguém acreditava que daria para produzir azeite. Mas deu! Rodrigo me contou ao telefone que a família sempre lidou com comércio de alimentos e ele buscava uma cultura perene e queria produzir algo de qualidade. Já criou coelhos, já cuidou do negócio de queijos da família, mas é na olivicultura que está apostando para construir sua história. E nome La Pataca vem das moedas de ouro encontradas na região, que era rota de tropeiros.

Rodrigo Sgorla, o produtor do La Pataca.

Os azeites La Pataca podem ser encontrados nas lojas da família Sgorla, em Caxias do Sul, em dois endereços:

Rua Ernesto Alves, 2205 – Bairro Centro
Rua Angelina Michelon 338 – Bairro Lourdes

umlitrodeazeite

One Comment

  1. Sandro, parabéns pelo texto que dá prazer em ler tanto pelo conteúdo quanto pela forma.
    Parabéns e muito obrigada também pela grande contribuição que seu trabalho oferece à olivicultura brasileira e aos apaixonados pelo azeite em geral. Estamos aprendendo, conhecendo, nos educando e criando um novo saber sobre o assunto e, você, é professor.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *