Sopa de siglas: como ler rótulos de azeite e evitar pegadinhas

Baixa a temperatura, aumenta a vontade de uma boa sopa. Sopa, pão, azeite, vinho e amigos – é juntos e shallow now! E para a sorte dos brasileiros, nossos azeites estão no auge do seu frescor, já que a extração terminou em março, os azeites foram decantados e filtrados e estão chegando às gôndolas.

Ou não. Dei uma volta por algumas boas lojas de São Paulo faz menos de um mês e encontrei azeites da safra passada, extraídos em 2018. De acordo com o rótulo, eles estão dentro da validade de 24 meses. Mas já estão envelhecidos e não faz sentido compra-los se temos azeite novo à disposição.

O que acontece com um azeite quando ele envelhece?

Muita gente se acostumou a comprar azeites levando em conta a baixa acidez. O post mais acessado do 1LA é aquele em que eu explico que acidez não é o único parâmetro de qualidade de um azeite. Uma coisa que não contei nesse post é que a acidez é um parâmetro químico razoavelmente estável, que não varia com o tempo. Ou seja, é um excelente indicador de qualidade na extração, mas não conta nada sobre o envelhecimento do azeite. Logo abaixo da acidez, nos rótulos, aparece um item chamado “Índice de Peróxidos” e esse, sim, conta bastante sobre a evolução do azeite.

O que são os peróxidos?

Peróxidos são uma espécie de bola de cristal para se prever como um azeite vai se degradar. Simplificando bastante, são os primeiros elementos que surgem quando um azeite começa a se oxidar. O valor dos peróxidos aumenta, chega a um pico e depois diminui. E não diminui exatamente porque os peróxidos desaparecem. Pelo contrário, eles se degradam mais ainda e dão origem a aldeídos e cetonas, que são os responsáveis pelo sabor rançoso de azeites velhos. Ou seja, se o índice de peróxidos já está alto no início, é possível prever que o azeite vai se degradar mais rápido.

Tem peróxido no meu azeite?

Sempre tem, porque o processo de evolução química nunca para (usei evolução química só para evitar a palavra “degradação”, mas foi um eufemismo meu). O limite máximo, previsto em lei, para peróxidos em um azeite é 20 meqO2/kg (miliequivalentes de oxigênio por quilo). Um bom azeite tem menos que 12. Um excelente azeite tem menos que 8.

Como está o índice de peróxido dos azeites brasileiros?

Está uma maravilha. Escolhi aleatoriamente três garrafas de azeite brasileiro da safra 2019. O azeite Sabiá da Mantiqueira tem um índice de peróxidos de 1,38. O Olivas do Sul, que estampa esse índice na parte da frente do rótulo, 2,89. O Costa Doce, 3,97. Todos, portanto, bem abaixo do valor de referência de 20 meqO2/kg.

Olha a pegadinha do peróxido!

Para comparar, peguei um azeite português que eu gosto bastante e verifiquei o rótulo. O índice de peróxidos está apenas indicado como igual ou menor ao 20. Ou seja, dentro dos parâmetros exigidos pela lei, mas não ajuda a entender a qualidade do azeite. E aqui é importante pensar pelo lado do produtor: às vezes ele precisa economizar na impressão dos rótulos e em vez de imprimir uma tiragem para cada índice, imprime uma quantidade grande apenas especificando o valor de igual ou menor que 20 meqO2/kg.

Olha a pegadinha do rótulo!

Não há exigência legal para data de validade no rótulo dos azeites. O prazo que consta no rótulo, normalmente de 24 meses, é apenas uma convenção adotada por produtores. Na mesma garrafa do Costa Doce que está à minha frente, o prazo de validade é de 12 meses (vale lembrar que o escoamento da produção atendendo às demandas do mercado e contando com uma única safra por ano é um dos maiores dilemas dos olivicultores). Melhor que olhar validade, é olhar a data de extração para garantir que está comprando azeite bem jovem.

O que eu faço com isso?

Faça sopa e use o azeite mais jovem que você puder ter em mãos! Sirva a sopa com pão, vinho e conte para os amigos o que são os peróxidos.

Veja as receitas de sopa que já publiquei por aqui:

Sopa cremosa de milho

Sopa de alho-poró com cerveja

Sopa de abóbora australiana

Sopa de grão-de-bico com limão

Avgolemono

umlitrodeazeite

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